WEB SÉRIE DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA: LIBERALISMO PARTE 4

DR Rômulo Félix explica como a religião no liberalismo é subjugada a esfera privada.

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As Relações entre Moral X Direito e entre a Cultura X Religião, no Liberalismo.

Uma vez que o indivíduo é autônomo, segundo a concepção liberal, ele não reconhece outras normas além daquelas que ele dita a si mesmo, estando, assim, todos os valores morais reduzidos ao subjetivo. Tal concepção faz do homem um ser dotado de autoridade máxima sobre o bem e o mal e independente dos demais, pois o indivíduo tem liberdade e autoridade para suas decisões, individualmente falando. 1

Nota-se que não há espaço para a religião, tida como algo totalmente subjetivo e relegada à esfera privada, não podendo interferir na sociedade como um todo e nem no Estado, assim temos: a separação entre o Estado e a religião; entre a moral e a religião, já que a moral passa a ser definida pelo indivíduo; e por fim, a separação entre o direito e a moral, iniciando o que chamamos de positivismo jurídico, bem explicado pelo Papa Bento XVI nesse trecho de um de seus discursos em que afirma que no positivismo jurídico a “legislação se torna com frequência somente um compromisso entre diversos interesses: procura-se transformar em direitos, interesses particulares ou desejos que contrastam com os deveres derivantes da responsabilidade social. Nesta situação, é oportuno recordar que cada ordenamento jurídico, tanto a nível interno como internacional, haure em última análise a sua legitimidade da radicação na lei natural, na mensagem ética inscrita no próprio ser humano. Em definitivo, a lei natural é o único baluarte válido contra o arbítrio do poder ou os enganos da manipulação ideológica.” 2

Essa exaltação dos valores individuais também afeta o plano da cultura, que é concebida como uma atividade autônoma, desvinculada dos valores éticos e a arte acaba por receber uma liberdade absoluta desprovida de verdade. É o culto da “arte pela arte”. Nesse contexto, é frequente a mentira, travestida de verdade, da “liberdade absoluta de expressão”, em que, em nome de tal liberdade, se pode dizer e fazer tudo o que bem quiser no campo da arte e qualquer ação do Estado para limita-la é vista como censura, mesmo que, em nome dessa liberdade, vilipendie pessoas, crenças e raças e mesmo que se utilize dessa liberdade para propagar tudo o que é imoral e nocivo à sociedade e o mais grave, mesmo que denigre a imagem de Deus, na Pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo, na Sua Santa Igreja e nos Seus Santos. O Estado tem o dever de, em nome do bem comum, limitar a liberdade onde ela se volta contra o bem comum de todos. Isso não é uma ação ditatorial, nem comunista, nem fascista, nem nazista, é simplesmente justiça.

No plano religioso, o liberalismo conduz de início ao um indiferentismo e em seguida ao ateísmo. A religião se reduz a sentimentos subjetivos e relegado apenas à esfera privada, sem nenhuma influência na esfera pública e, em nome do laicismo, toda e qualquer busca de interferência da religião na esfera pública é tida como uma afronta ao estado democrático de direito e uma agressão a laicidade do Estado. Como consta no Compêndio da Doutrina Social, tal pensamento revela um laicismo intolerante e ateu por parte dessa democracia liberal, “que hostilizam qualquer forma de relevância política e cultural da fé, procurando desqualificar o empenho social e político dos cristãos, porque se reconhecem nas verdades ensinadas pela Igreja e obedecem ao dever moral de ser coerentes com a própria consciência; chega-se também e mais radicalmente a negar a própria ética natural. Esta negação, que prospecta uma condição de anarquia moral cuja consequência é a prepotência do mais forte sobre o mais fraco, não pode ser acolhida por nenhuma forma legítima de pluralismo, porque mina as próprias bases da convivência humana.” 3

Conclusão

Diante de todo o exposto nessa série de quatro textos sobre o liberalismo, concluímos que a sociedade liberal, fruto da ideologia liberal que desatou os homens dos vínculos que o protegiam, especialmente da Moral Católica e dos corpos naturais, o escravizou: no campo religioso, às divindades da Ciência, do Progresso e da Democracia; no campo intelectual, submetendo-o aos mitos do materialismo evolucionista ao separar a razão da fé, tida como uma mera superstição e relegada a ser vivida apenas na esfera privada; no campo da moral, ao sentimentalismo romântico de uma liberdade individual que não reconhece limites levando a uma ditatura do relativismo que não aceita uma verdade universal a quem todos devem obediência; no campo econômico, ao despotismo do dinheiro em que o lucro é o fim da economia e não o bem comum dos homens; no campo político, à oligarquia dos homens sem virtudes que governam o povo buscando seus interesses pessoas ou de partido e não o bem comum temporal dos governados. 4

Sobre a ditatura do relativismo, vale dar um destaque, já que tem se tornado cada vez mais o maior desafio para a evangelização da Igreja no tempo moderno, como bem denunciou o então Cardeal Joseph Ratzinger, pouco antes de sua eleição como Sumo Pontífice da Igreja Católica: “Quantos ventos de doutrina conhecemos nestes últimos decénios, quantas correntes ideológicas, quantas modas do pensamento… A pequena barca do pensamento de muitos cristãos foi muitas vezes agitada por estas ondas lançadas de um extremo ao outro: do marxismo ao liberalismo, até à libertinagem, ao coletivismo radical; do ateísmo a um vago misticismo religioso; do agnosticismo ao sincretismo e por aí adiante. Cada dia surgem novas seitas e realiza-se quanto diz São Paulo acerca do engano dos homens, da astúcia que tende a levar ao erro (cf. Ef 4, 14). Ter uma fé clara, segundo o Credo da Igreja, muitas vezes é classificado como fundamentalismo. Enquanto o relativismo, isto é, deixar-se levar ‘aqui e além por qualquer vento de doutrina’, aparece como a única atitude à altura dos tempos hodiernos. Vai-se constituindo uma ditadura do relativismo que nada reconhece como definitivo e que deixa como última medida apenas o próprio eu e as suas vontades.

Ao contrário, nós, temos outra medida: o Filho de Deus, o verdadeiro homem. É ele a medida do verdadeiro humanismo. “Adulta” não é uma fé que segue as ondas da moda e a última novidade; adulta e madura é uma fé profundamente radicada na amizade com Cristo. É esta amizade que nos abre a tudo o que é bom e nos dá o critério para discernir entre verdadeiro e falso, entre engano e verdade. Devemos amadurecer esta fé, para esta fé devemos guiar o rebanho de Cristo. E é esta fé, só esta fé, que gera unidade e se realiza na caridade. São Paulo oferece-nos a este propósito em contraste com as contínuas peripécias dos que são como crianças batidas pelas ondas uma bela palavra: praticar a verdade na caridade, como fórmula fundamental da existência cristã. Em Cristo, coincidem verdade e caridade. Na medida em que nos aproximamos de Cristo, também na nossa vida, verdade e caridade fundem-se. A caridade sem verdade seria cega; a verdade sem caridade seria como “um címbalo que retine.” (1 Cor 13, 1)

Essa sociedade liberal foi a base pela qual o marxismo surgiu e pôde se desenvolver com consequências ainda mais nefastas que as do liberalismo e esse será o tema da próxima série de textos.

Salve Maria e Viva Cristo Rei!

Rômulo Felix do Rosario, casado, pai de 5 filhos, sendo 3 no Céu, médico pediatra, professor no Centro Anchieta (www.centroanchieta.org), uma iniciativa de fiéis católicos que visa promover a cultura católica nos mais variados âmbitos da vida do homem tendo como finalidade a busca da santidade. Coordenador do Projeto Social Vida, um grupo pró-vida da paróquia Nossa Senhora de Guadalupe, área pastoral de Vila Velha e Ministro Extraordinário da Distribuição da Sagrada Comunhão Eucaristia na mesma paróquia.

Referencias:

  1. A Ordem Natural, Carlos Alberto Sacheri, Edições Cristo Rei, 1 ed., p. 69.
  2. http://www.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/speeches/2007/february/documents/hf_ben-xvi_spe_20070212_pul.html
  3. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, nº 572.
  4. Padre Julio Meinvielle, Concepção Católica da Política, editora Centro Anchieta, 1ª ed., pg. 115 – 116.
  5. http://www.vatican.va/gpII/documents/homily-pro-eligendo-pontifice_20050418_po.html